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28 de abril de 2017

OBRIGADO SANTA TEREZA.

"Coreto de Santa Tereza" - Aquarela de Maíra Onofri


SANTA LEMBRANÇA

Por: Hamilton Gangana

O mestre Pixinguinha (1897/1973) estava completando 120 anos de nascimento, era também o Dia Nacional do Choro, 23 de abril - um domingo de manhã clara, sol leve e clima agradável, e uma pequena multidão assistia ao tradicional programa do Acir Antão, transmitido ao vivo pela Itatiaia, de um palanque armado pelo SESC, na praça Duque de Caxias, em Santa Tereza. Grupos de choro e samba de São Paulo, Rio e BH se apresentaram em sequencia e a plateia fazia coro, relembrando memoráveis sucessos da música popular brasileira, imortalizados por grandes ídolos, fechando as festividades da semana, programadas pelo Clube do Choro de BH, em 2017.
Eu estava presente naquele lugar, que conheço desde criança, e passavam pela minha cabeça, alguns fatos, comemorações , nomes de pessoas, acontecimentos e lembranças dos meus tempos de morador, vividos no bairro onde nasci e tive o privilégio de ser criado.

Meu pai, o Sargento Gangana (1905/1974), serviu no Quinto Batalhão da PM, era chefe de família com muitos filhos (foram quinze irmãos) e moramos em várias casas alugadas, na rua Conselheiro Rocha, na praça Duque de Caxias, na rua Formosa, na Salinas e, por último, na Alvinópolis. Fiz o primário no José Bonifácio, dirigido pela professora Maria Suzel de Pádua e minhas professoras de classe foram dona Geny, dona Carmem, dona Elisabeth e dona Hilda, esta moradora do bairro e casada com o coronel José States do Valle. É impossível esquecer as festas do grupo escolar e das missas do pároco José Taitson e suas inflamadas preleções no púlpito; da espera do pão quentinho e cheiroso nas Padaria Seleta e Santa Tereza; da banda da Quinto Batalhão (onde está o Colégio Tiradentes), executando dobrados no coreto e tocando em marcha pelas ruas; das festas juninas com fogueira e panelões de canjica, dança de quadrilha, queima de Judas e o pau de sebo; das animadas barraquinhas que levantavam contribuições para construção da parte de cima e das duas torres da igreja; dos filmes seriados nas matinés dominicais; da pensão de dona Maria Toledo, na rua Mármore, que servia almoço a militares; das peladas e do bente altas no campo do quartel; do carnaval puxado pelo bloco “Eu não rapo nada” e a febre dos blocos caricatos; da arrumação de ruas com folhas e enfeites, madrugada a dentro, para a passagem solene da procissão do enterro, na sexta-feira Santa.

Santa Tereza era o máximo, tinha de tudo, como uma pequena cidade do interior e todos se conheciam. Tinha um bom carnaval e um respeitado time de futebol, campeão amador, anos seguidos e o teatro Ideal criado pelo dentista prático, seu Manoel Teixeira; o enorme cine Santa Tereza; as festas religiosas, serestas, casas de dança, o footing na pracinha, muitos bares, música e boemia sadia. As festas familiares eram sempre invadidas pelos penetras, entrava um de cada vez. E quem não possuía bicicleta, alugava a sua no Corino. Entreguei roupas na Tinturaria Santa Tereza; pães da Padaria Seleta e amarrei feixes de lenha na Lenharia Oliveira, para ganhar uns trocados; a gente produzia os próprios carrinhos de rolimã e patinetes para rodar no asfalto, e também as simplórias tábuas de sebo, que deslizavam, perigosamente, pelas ruas íngremes, sobre o calçamento de pedras.

Era moda um esporte muito perigoso, praticado entre os jovens: o desafio de saltar do bonde em movimento. E outra aventura corajosa era viajar de trem, clandestinamente, até Sabará, para nadar e passear. Os meninos conheciam de vista e morriam de medo da fama de malvado do Zé Prego, um negro esguio que dava muito trabalho à sua família, ao ser preso, várias vezes, por praticar pequenos furtos. Na rua Formosa, o caolho “dem-dem”- que vai à missa e logo vem. E João Lana, um alcoólatra popular, que tomava umas e outras e saía cambaleando pelos passeios, recitando frases de efeito: - “Quem bebe, morre. Quem não bebe, morre também. Então, vamos beber”...

Mais tarde, os músicos da família do jornalista Salomão Borges – Márcio, Telo , Marilton - mais o Fernando Brant (1946/2015), Toninho Horta, Beto Guedes e Milton Nascimento, criaram o badalado Clube da Esquina, ( Paraisópolis com Divinópolis), movimento musical que ajudou muito a divulgar e valorizar a veia musical do bairro, mundo afora.

E Santa Tereza sempre foi considerado um bairro bom pra morar, alegre, festivo e familiar, mesmo convivendo com um problema crônico, a eterna falta de água nas torneiras. A água era disputada em caminhões pipa da Prefeitura. O problema só foi resolvido na administração do prefeito- engenheiro Celso Melo Azevedo (1915/2004), que cumpriu a promessa de campanha, como anunciava a repetida frase musical no jingle do rádio: - “Minha casa falta água, minha rua não tem condução... Celso Azevedo é a solução”... (voz) - Celso Azevedo, o primeiro filho de Belo Horizonte a governar sua terra natal”... 
Foi a estreia do meu orgulhoso título de eleitor, em 1955.
Hamilton Gangana é associado e Conselheiro do Clube do Choro de BH